domingo, 14 de janeiro de 2007

See you, New York.

Fotografia de LM



Podemos ser agarrados pelos cabelos. Puxam-nos, atiram-nos contra a parede, magoam-nos. Prefiro que me apertem a garganta, me tirem o sopro, me arranquem o fôlego. É uma angústia boa, esta, principalmente quando se desata o nó(s). Por não termos para onde ir sabemos onde não queremos estar. Por termos de partir sabemos que só podemos ficar.
A primeira imagem. Desdobrava-se em papéis de cor e uma longa espera, fascinante, desejada, mas sozinha. Times Square. A travessia do ano, um mergulho num rio de “blinding lights”. Dois, no caso: East e Hudson. Percebi depois que a mesma cidade que me venceu pagava a energia à custa do mundo e deste correr de águas, de um lado e do outro, aniquilada por ela própria.
Como em todas as montanhas, do pico vê-se o fundo, do vale elevam-se os olhos. É este sobe e desce constante que afinal empurra o carrossel e o faz girar. Na mesinha de cabeceira continuam livros que não li, música que pouco ouvi, lições que não estudei, cartas que deixei por escrever, números por marcar e uma vela por acender. Que bom que há coisas que abandonamos inocentemente, mas como se adivinhássemos um dia revisitar, retomar, voltar a pegar. O ponto da largada será sempre diferente, é certo. Por isso valeu a pena.
Disparei a máquina inúmeras vezes mas na cabeça estão fotografias que nunca tirei: as do coração. Os amigos que fiz, os amores, a paisagem, a luta, os voos, a viagem. Eu que gosto de cinema vi-me dentro do filme. Passei a personagem animada, numa obscuridade própria de Burton, sempre com Johnny do outro lado da linha. “Path”. Soa bem para quem percorreu muito mas até parece nada. Obriga-me a pensar que há mais, e o sentido é só “em frente”.
Cheira-me a cupcakes com sprinkles arco-íris e a piquenique da meia-noite. Soa-me a Bono rouco, a Jagger louco, a Rufus homo… Continuo a sonhar com uma casa no Village mas com o ambiente alternativo de Williamsburg. Vou reparar nas tintas no chão, nos riscos nas paredes. Vou repudiar os maus cheiros, os passeios obstruídos de lixo. Vou correr à noite no parque, caminhar de dia nas ruas. Vou comprar pão polaco e diet coke para regar. Noodles, brownies, marshmallows. Vou esperar o carteiro coxo, querer o leite com chocolate do Peter Pan, após um “Mufin Sugar Free”, o sushi e os pauzinhos, e queixar-me das insónias quando acordada pelo choro da criança dos vizinhos. Vou aproximar-me da velha “lady” que aos domingos de manhã empresta uma cantoria celeste à estação de Bedford e me faz querer ter uma avó negra. Vou cruzar-me com caras diferentes e querer ser igual, vou sentar-me naquele banco de jardim, o mesmo das histórias, tomar um café pensativo no Fix, desfilar no Meat Packing do “Sex and the City” e rir-me de mim por empilhar sapatos que não uso no armário, depois de me render a este vício made in Manhattan…Porque há coisas que não mudam.
O telhado. Ouviu tantos episódios, carregou tanta gente. Tanto, gente. Foi confidente, foi comédia, foi desespero e atalho para o salto, foi praia, ponto de encontro e miradouro. O MEU. Trepo as escadas uma vez mais. Brindo (ao que quer que venha). A última, como a primeira imagem, é escura mas cheia de brilho…
See you, New York.


LM

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