quarta-feira, 17 de janeiro de 2007

Outono

Apesar de “meio”, “no meio”, “do meio”, “a meio” serem inutilizáveis deste lado, a verdade é que, por onde quer que haja uma árvore perto, as ruas enchem-se de folhas, todas em tons de castanho e seco, tombadas por um Outono impertinente. O vento já corta, num frio aflitivo a garantir a neve dos meses que se aproximam. Até sei porquê a associação, mas a imagem faz-me desaparecer em Paris. Sempre tive paixões atrozes por cidades vadias. Comem-me até à medula, fazem-me chorar, cair, levantar, mas a combustão é tão forte que adoeço só de pensar que não são minhas. E porque a relação nunca foi recíproca, acabo sempre por partir. Na agenda para o fim de Novembro já há data para o regresso a casa. CASA. Nos últimos tempos tenho tido dificuldade em encontrar um significado justo para a palavra, acolhedora e mãe. Por agora sei que é o mar, o mesmo que me viu crescer e de quem sou cúmplice, e as saudades. A família reclama a presença, os amigos batem palmas (espero que em jeito de “concordo”). Definitivamente, marquei o meu retorno. Definitivo?
A semana foi aborrecida. A Norman Avenue já nem consegue entender porque me tranco. Atirou-me para a cama uma gripe surpresa, que pensei ter sido curada com mimos. O remédio foi-se, a maldita fica. Foi tempo de rever matéria dada e perceber, que tal como cravo as unhas no francês a ver se agarro, o meu inglês nem deixa marcas. É o resultado de continuar a conviver na língua materna, no círculo de amigos e no trabalho. As aulas já não são o suficiente para uma prática eficiente. Envergonho-me e desespero. Continuo a deixar que a porta me bata na cara, quando troco “pull” e “push” e já não uso outro adjectivo para além de “awesome”. É mais do que claro, estou doente.

LM, Outubro de 2005
NewYork

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