quinta-feira, 17 de setembro de 2009

É a vida!

Parece que ainda agora entrei na Universidade com o nariz a pingar água enfarinhada e os olhos esbugalhados de sono, tantas foram as subidas ao escadório mais íngreme do distrito, de costas, com um mapa que indicava o arbusto selvagem menos protegido da época, urinol de uns quantos rapazes apertados de vida nas veias! Ora, estava em Portalegre, o meu retiro de estreia, depois de uma inútil tentativa de entrar para medicina. Só então veio Braga. Evitei, primeiro, mas depois deixei que a cidade se infiltrasse. Atirada para o lado dos transferidos, de onde só um padre se salvava, acabei na perdição do grupo-mor: As Brasas! Tudo porque a mais loira das serranas (as piadas jocosas não são bem-vindas, já que a miúda é uma pedra preciosa!), decide apimbalhar qualquer momento, falando no sentido literal da coisa, e aproveitou para me sacar uns estalinhos de dedos em uníssono com a Ágata. Apanhada! Se o Emanuel não se tivesse expressado com tanta clareza, ainda hoje estaríamos nas ruas da amargura sem saber apelidar aquele género musical que dignifica as “Noites com Lina”. Daí para a frente foi um passo! Subiu-se de nível e interesse. À brasa de Seia juntaram-se as brasas de Braga, do Porto, de Gaia, de Valongo, da Palhaça… enfim! Miúdas com pinta de gangsters finos, vestidas de rock n´roll em salto alto e acompanhadas por Bach. Sim, porque os meus serões eram, quase sempre, bem diferentes. Enquanto as meninas se serviam nos bares da época, já eu ficava a ouvir os gritos de alegria dos animalejos noctívagos no Conservatório Calouste Gulbenkian. Conto, pelo menos, uma barata e outro dito rastejante que não consegui decifrar. Obra do Espírito Santo, alguém tinha conseguido uma licença para que eu estudasse piano, imagine-se, quando todos os outros dormiam (ou não!). Mas não perdi os bailes dançantes onde, não eram raras as vezes, abríamos e fechávamos a porta do recinto… em cima de colunas de som! Como íamos lá parar? Inebriadas, talvez, não pelo álcool (todas alérgicas, fique assente!) mas pela esperança de mudar a rota do mundo. Meses depois escolhíamos lugares desencontrados: Espanha, Bélgica, Grécia, Itália. Acumulámos outras tantas experiências, línguas, caminhos, e voltámos mais pesadas, com a aventura a brotar-nos dos olhos. Alguns fizeram amigos, outros fizeram mais-do-que-amigos. Todos fizeram mais. Isso continua a ser importante. No ano seguinte, houve tempo para atirar os pijamas para umas festas, e depois despedirmo-nos num até breve que, em alguns casos, dura até hoje.
Parece que ainda agora entrei na Universidade com o nariz a pingar água enfarinhada, e já dou por mim a ler as novidades de rostos queridos que se multiplicam e são, pelo menos, já quatro. As barrigas crescem de felicidade e os nós vão-se apertando com justeza no peito. Mulheres com letra grande, que se fizeram à estrada e cumprem a missão mais importante: viver!
Sou a próxima!

LM

3 comentários:

Unknown disse...

Arrepiaste-me e divertiste-me. Tens o dom maravilhoso de desdobrares as memórias com poesia. Viver, eis a missão máxima. És a próxima? Gostei de saber. Feliz continuo desde a primeira linha.

LM disse...

Obrigada, minha querida! O nosso reencontro fugaz pelas palavras, ontem, fez-me viajar até esses tempos. Estou muito contente por vos saber assim: grandes! E sou a próxima, claro! No próximo ano, espero, já terei novidades :)

Anónimo disse...

Olá Liliana,
fomos perdendo o "rasto" uns dos outros e com o passar do tempo nem sabemos bem porquê...mas nunca nos esquecemos de ti e do tempo que vivemos juntos. Vamos perguntando por ti e sabemos que estás bem. Ficamos felizes. Beijinhos